quinta-feira, 28 de agosto de 2025

Fé, Escola Laica e Direitos Humanos: Reflexões a partir de uma Pesquisa



Ontem participei, a convite do professor Clayton Scarcella de uma apresentação de um relato de prática no Instituto Federal de Guarulhos sobre o curso Estudante Mediador dos ODS. Durante o encontro, duas pesquisas foram apresentadas, e uma delas chamou bastante atenção: um levantamento realizado com estudantes do Instituto Federal de São Paulo e de uma Escola Estadual regular  que revelou entre outros dados a religiosidade dos alunos.

Os resultados da pesquisa mostraram um número expressivo de estudantes evangélicos e protestantes em ambas as instituições. Minha percepção é que essa tendência, também se reflete em outras escolas públicas, apontando para um futuro em que o perfil religioso dos estudantes será cada vez mais marcado pela presença de jovens evangélicos e protestantes. Essa realidade nos provoca a pensar: como a escola laica deve lidar com esse fenômeno no cotidiano de suas ações educativas?

Um detalhe simbólico me marcou: ao usar o banheiro da instituição, vi a frase “Viva Exu” pintada na parede. A mesma pesquisa indicou, ainda que em número menor, a presença de estudantes que se identificam com religiões de matriz africana. Trata-se de algo significativo, especialmente considerando o preconceito histórico que muitas vezes silencia essas manifestações de fé.

Essa experiência reforça minha percepção de que os Direitos Humanos relacionados à liberdade de crença precisam ser entendidos como uma lente – um verdadeiro “óculos” – que nos ajuda a enxergar e repensar a forma como desenhamos as ações educativas e de intervenção social dentro da escola.

Outro dado apresentado pelos bolsistas do PIBID revelou que também há um número relevante de professores evangélicos e protestantes, embora em menor proporção no Instituto Federal. Essa informação nos leva a uma questão delicada: quando a educação trata a fé cristã evangélica apenas como um problema de embate, corre-se o risco de renunciar ao diálogo cultural com um grupo numeroso de estudantes e professores que têm nesse campo religioso uma maneira legítima de ver o mundo.

É claro que a escola deve se manter laica e combater todas as formas de preconceito. No entanto, não podemos ignorar a influência das famílias e da religião na formação dos alunos, especialmente das crianças. Muitas vezes, vemos a religião alinhada automaticamente a determinadas posições políticas, como se houvesse uma equivalência inevitável: “quem é de um lado, pertence a tal religião”. Mas será que essa leitura não é simplista demais?

Talvez o desafio esteja justamente em compreender esse cenário complexo e construir um espaço educativo que, sem abrir mão da laicidade, saiba reconhecer, respeitar e dialogar com as diferentes expressões de fé presentes na escola.

Por Carlos Lima : Educomunicador e professor

Imagem: Obra no corredor do Instituto Federal de Guarulhos produzidos por estudantes 

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